Dave Holland é dono de uma carreira já bem longa, acompanhando gigantes do jazz nas suas épocas áureas como Miles Davis, Herbie Hancock, Pat Metheny ou Chick Corea. Another Land é o regresso aos discos, primeiro registo em nome próprio pela emergente Edition Records, com Kevin Eubanks na guitarra e Obed Calvaire na bateria [depois de Good Hope (2019) do Crosscurrents Trio com Zakir Hussein e Chris Potter (crítica AQUI)]. A vontade de criar e expandir o seu virtuosismo está bem patente em todo o alinhamento, que leva o jazz para o território do rock.
O tema-título é suave como poucos na carreira de Holland, cortesia do bom gosto de Eubanks, que, passado o tema, se concentra em explorar as potencialidades de conversa com o trio e o ouvinte por via das seis cordas da guitarra (com um belo solo de Holland) e encontra companhia em “Quiet Fire”, que o guitarrista toma para si em exclusivo, num solo ainda mais calmo, pleno de harmonizações em torno da simplicidade da melodia. “Passing Time” vai nesta “onda” também, com longos compassos e notas espaçadas, que a pressa é inimiga da perfeição.
O trio de músicas “Grave Walker”, “Gentle Warrior” e “Mashup” funciona como o marcador genético do disco, pela diversidade que contêm, ao mesmo tempo que mantem na base o jazz mais tradicional, possibilitando uma enorme liberdade aos músicos para explanarem todo o seu manancial técnico. “Grave Walker” é perfeita para abrir o álbum. Composição limpa e directa, que Eubanks espreme ao máximo para nos dar a beber o doce néctar da sua genialidade, multiplicando notas e surpresas na proporção directa do nosso maravilhamento. “Mashup”, um dos singles já lançados, transpira rock desde os riffs inaugurais, e Eubanks não se faz rogado nas cartadas que joga ao longo dos mais de seis minutos desta faixa, fixando-se no improviso em torno de derivações do tema e de iterações de riffs que vai construindo, com Calvaire a seguir-lhe os passos e a construir sobre as pistas que o guitarrista vai deixando até ao solo final. Puro divertimento.
“The Village” começa com Holland no baixo eléctrico a mostrar que quem sabe nunca esquece, mas é mais uma vez Eubanks que projecta a música para a estratosfera com um solo electrizante e um riff em falso “loop” que dá a deixa ao solo do discreto mas não menos fabuloso de Obed Calvaire. Impossível não imaginar como soará esta música em palco.
“Bring It Back Home” fecha o disco com sabor a música de airplay americano com camadas de açúcar jazz, com Obed Calvaire a construir o cenário rítmico para a melodia e os solos de Eubanks (são quase indistinguíveis, tal a leveza com que são tocados) e o constante e preciso contrabaixo a segurar as pontas soltas.
Para quem já não se lembrava de Kevin Eubanks, Dave Holland expõe-o na vitrine da sua música, um músico extraordinário potenciado por dois amigos e companheiros que o complementam e elevam, num disco bem ao estilo de Holland, bandleader experiente que sempre soube escolher a dedo os intervenientes nos seus ensembles. (Mais) um disco extraordinário.
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