Há vidas mais fáceis que outras, há quem não precise de trabalhar tanto para sobreviver, há quem não sofra de nenhuma perturbação comportamental e há quem não tenha uma orientação sexual ou identidade de género não-normativa. Há também quem viva insipidamente e quem se recuse a tal.
A ética do cuidado caiu em desuso. Tentámos. Há dias em que mostrar, com amor, as feridas sistémicas que se perpetuam na sociedade e contra as minorias, é uma tarefa ingrata. As citações de Catarina Filipe: ”Quando chegar ao topo vou levar todas para cima” e Platão: ”Uma vida não questionada não merece ser vivida.” coexistem e são válidas.
Até rimos das ofensas mas pensamos em todes es amigues que cometeram suicídio, naquelus que vivem na rua e que nos pedem dinheiro para comer, naquelus que perderam a força às mãos da violência, da falta de autoestima e casa. Tudo em nome do ódio e de convenções sociais datadas.
Viva o humor e a classe de quem o recebe bem, luta todos os dias e dedica-se a causas maiores que não abater outras em esforço pela visibilidade. Pelo revisionismo histórico e pela justiça: “Em frente, corajosamente!” Já dizia Joana de Arco.
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Rafaela Jacinto é artista, ativista e queer desobediente do teatro e da escrita. “A música está na minha cabeça” é o seu terceiro livro, depois de “Regime” (2020) e “Fiz uma coisa má” (2021), ambos editados pela Douda Correria. Nasceu em 1994, licenciou-se em Teatro pela Escola Superior de Teatro e Cinema (2016) e é especialista em História e Cultura das Religiões pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa (2019). Estudou ainda Cinema Documental e trabalhou na última década com os realizadores Joaquim Pinto e Nuno Leonel.
Maravilhoso texto, intenso no conteúdo e na forma desasombrada como coloca o dedo na ferida. Tão importante sentir o texto e agir para mudarmos comportamentos.