O concerto a que assistimos no passado dia 16, no Guimarães Jazz, foi um dos momentos mais marcantes desta edição. Acompanhados de Rainer Brüninghaus (teclas) e de Yuri Daniel (baixo), Jan Garbarek e Trilok Gurtu ofereceram aos espectadores do Centro Cultural Vila Flor uma grande noite.
O percurso de Garbarek fala por si: estamos perante um dos nomes mais importantes da cena jazzística das últimas décadas. A latitude que a sua música abrange é, de facto, notável, e é precisamente esta heterogeneidade que constitui a chave para a abertura dos diálogos que a sua música propõe. Lembrar que o saxofonista já trabalhou com Keith Jarrett, Charlie Haden, Gary Peacock, Zakir Hussain ou Eleni Karaindrou, só releva o lugar central que sua música ocupa, seja como líder ou sideman, e tê-lo no Guimarães Jazz era, antes sequer da primeira nota, um privilégio. Nada a que os organizadores do evento não nos tenham já habituado.
Os músicos agarraram desde cedo o público e, à medida que se progredia no alinhamento, crescia a empatia entre músicos e espectadores. Os solos e duos que pautaram o espetáculo foram sempre sólidos: Brüninghaus e Daniel proporcionaram um interessante diálogo e, no final do concerto, o natural destaque para os “divertimentos” de Garbarek (na flauta) e Gortu, como é, de resto, habitual quando estes músicos atuam ao vivo. Aqui reside um pequeno senão: nada de propriamente inovador em relação ao que era esperado. Neste sentido, embora a postura dos músicos indiciasse uma certa frescura e espaço para o improviso, não pode dizer-se que a espontaneidade tenha marcado presença no CCVF.
Se Garbarek era, provavelmente, o nome mais sonante, foi o percussionista indiano Trilok Gurtu quem mais brilhou. Demonstrando toda a sua técnica, foi capaz de dialogar na perfeição com cada elemento e foi, também por isso, o destaque da noite. Brilhante a todos os níveis, apesar de um início algo hesitante, o que se viu e ouviu correspondeu às expectativas que eram, diga-se, muitíssimo elevadas.
Ainda a propósito do concerto (ou talvez não), lembravamos os novos ventos que nos chegam do jazz nórdico, muito particularmente da Noruega de Garbarek, com o surgimento da jovem Mette Henriette (Mette Henriette Martedatter Rølvåg). Recentemente, Rui Eduardo Pais escrevia, acerca da música de Henriette, que não se lhe rasteavam influências de Garbarek e que ouvir a música da jovem compositora norueguesa seria como “se víssemos o pincel numa pintura e não apenas o que está pintado.” Ora, esta analogia à pintura é preciosa: a trajetória de Garbarek foi pondo de parte um certo teor abstracionista, para se abeirar de uma música mais referencial, dando a ver/ouvir o quadro todo. Estivéssemos nós no campo das artes visuais, e dir-se-ia que a mudança de paradigma de Garbarek foi uma espécie de regresso ao figurativo.
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