Felizmente foi a peça Teoria das três idades a encerrar a trilogia dos recém nascidos.
Talvez falar em recém nascido não seja rigoroso. Como a atriz Sara Barros Leitão ironiza, não só todo o teatro é experimental – pelo que o nome, Teatro Experimental do Porto, peca por excesso – como o TEP é o teatro mais antigo em Portugal, fundado em 1951. Um recém nascido crescidinho.
Caixas e mais caixas e a Sara deambula pelo espaço, enquanto uma cassete lhe dita como recuperar e organizar um arquivo. Entre as regras rígidas e a adaptação à realidade daquelas instruções, são as pausas (como sempre…) que fazem o teatro acontecer. O público ri, não há hipótese de falha (mesmo quando é previsível que entre o diz que faz e não faz – a fita cola já usada que afinal é inadequada, mas, ups!, afinal até há uma sem efeitos secundários letais para aquele papel velho – o desdizer talvez seja a chave da surpresa e da gargalhada). A Sara dá-nos o ritmo que precisamos para que o entusiasmo não esmoreça.
Em cena, faz uma incursão pelos arquivos do TEP, no meio do que ficou depois do incêndio nas instalações, das imagens registadas, das atas, das cartas recebidas e enviadas pelo encenador, pelo público, pelos associados… Resta o que ficou gravado em cassetes, a conversa no café com alguém que não queria gravador, as folhas de sala, os recados do diretor, os registos dos ensaios, as reivindicações dos atores, papel e mais papel com ‘sonhos’ de gente de longe que quer ser ator, que quer fazer teatro, folhas com memórias.
E é com sentido de humor, sensibilidade e ritmo que cose o espetáculo e percorre essas memórias. Com ela vivemos a censura, e os censores nunca se atrasam, o 25 de abril, o grito apaixonado, até à rouquidão (que o impede de repetir o espetáculo no dia seguinte), do ator, em alegria, naquele largo, fraterno e revolucionário 1º de maio.
No final, estamos todos de pé, a aplaudir a Sara e o TEP, celebrando o teatro e a paixão que a moveu para fazer este espetáculo.
O TEP renasceu das cinzas, e permanece vivo, a fazer e a levar teatro, o TEP e a sua gente que nasce e renasce sempre, essa gente genuína, vertical, lutadora que é a nossa gente, a gente do Porto. E que não esperem que refreemos entusiasmo depois de uma homenagem tão generosa a uma companhia da nossa cidade. Obrigada, Sara. Parabéns TEP. “Foi bonita a festa, pá”.
Por defeito profissional, Joana Neto escreve de acordo com o novo desacordo ortográfico.
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