home Didascálias, TEATRO Todo o Mundo é um Palco – Teatro da Trindade, 18/11/2017

Todo o Mundo é um Palco – Teatro da Trindade, 18/11/2017

O Teatro da Trindade resolveu sair de palco para comemorar os seus 150 anos, com Todo o Mundo é um PalcoBeatriz Batarda e Marco Martins saíram para a rua e trouxeram-na para o palco.

É de Lisboa que o espetáculo nos fala, desta nova Lisboa, com gente de tantos lugares, com tanto passado a querer tanto futuro, gente que se cruza e (des)encontra e (re)encontra em Lisboa, o lugar nenhum que é o seu… Várias nacionalidades, várias origens, vários credos.

Três atores em palco: Carolina Amaral, Miguel Borges e o também bailarino, Romeu Runa, que nos dá o corpo e a alma neste espetáculo. Dezassete não-atores: Aline Caldas, António Alberto Figueira, António Vasconcelos, Benmerja Abdelkader, Dewis Caldas, Heitham Khatib, Hélder Pina, Jean Bruno Massy, Jorge Pedrosa de Oliveira, Laure Cohen-Solal, Lucas Sadalla, Malena Camargo Caldas, Marco Pedrosa, Mick Mengucci, Moin Ahamed, Pascoal Silva, Safira Robens.

Da excelência da participação dos três em cena não falaremos tanto. É só o tanto no muito, o menos no tanto.

A Carolina é deliciosa no movimento, expressão e interpretação.

O Miguel é fantástico mesmo a “aprender a ficar parado”.

Não há como escrever sobre arte arrumando em gavetas admirações que o tempo adensa. A intensidade de Miguel Borges em cada palavra, por mais displicente que pareça, como se acabasse de chegar, casualmente, para tomar um café rápido, é perturbadora.

Não é menos verdade que os não-atores nos mostram que o palco é de todos. Que não há limites para criar, recriar e transpor limites.

Na peça há várias línguas, alemão e o francês as mais familiares, pares improváveis que falam e traduzem.

Há rostos cansados, joviais, feios, bonitos, reais… Há gente de verdade a falar do seu quotidiano, do seu percurso, ora em bicos de pés, ora de pescoço dobrado e corpo contorcido para chegar ao microfone.

Há danças e coreografias sui generis.

Há o vir para Lisboa por amor, para fugir, para trabalhar, para viver.

Há breakdance e os grandes feitos de quem domina a arte do io io com sotaque do Porto.

Há música de cada um e para cada um. Há Beatles e Nina Hagen.

Há até mesmo um bebé entretido no aparador, a dizer adeus a uma menina na primeira fila, ou a jogar ao espelho com atores e não-atores (ou que quer que sejam a não ser atores de corpo inteiro).

Não há fronteiras entre público e palco quando, desconcertantemente, os atores aplaudem o público com fervor.

Já fingiram de si mesmos alguma vez? Já? Em frente a uma sala cheia?

Já tiveram essa coragem neste frenesim de cidade, que parece desencorajar-nos de sermos quem somos, ao mesmo tempo que nos atira para a essência do que somos?

Parabéns ao Teatro da Trindade e a quem fez acontecer este espetáculo.

Não há nada mais bonito que trazer a verdade, por muito imperfeita que seja, às pessoas.

E, de pé, aplaudamo-nos, aos atores e não-atores, a Lisboa e ao palco da vida, enquanto ouvimos Aldous Harding cantar “Imagining My Man”…

O espectáculo mantém-se em cena até 10 de Dezembro. 

Joana Neto, por defeito profissional, escreve de acordo com o novo desacordo ortográfico.

Foto © João Tuna

Mais textos sobre Teatro AQUI

Outras peças da Beatriz Batarda e do Marco Martins AQUI

Deixe um comentário

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *