Comecei a ler Uma Catastrófica Visita ao Zoo de Joël Dicker numa ida ao posto dos Correios. A espera foi curta, deu para poucas páginas. Não comprei o livro, mas fiquei com a história na cabeça.
“Os meus pais queriam explicações, mas, para lhes explicar tudo, seria necessário explicar que a catastrófica visita ao jardim zoológico se devera ao catastrófico espetáculo da escola, que acontecera por causa da catastrófica peça de teatro, que fora encenada por causa da catastrófica visita ao Pai Natal, que acontecera por causa da catastrófica Santa Bofetada, que acontecera por causa do catastrófico curso de prevenção rodoviária, que acontecera por causa da catastrófica aula de ginástica, que acontecera por causa da catastrófica reunião no anfiteatro, que, por sua vez, acontecera por causa de uma catástrofe inicial.” (p. 18)
Voltei à obra dias mais tarde (não numa Loja CTT) e li-a de uma assentada. Está construída para isso: capítulos curtos, ação rápida, situações de suspense e uma narrativa que aponta como uma seta (que se desconstrói, aliás, ao desmontar esse vetor) para o desfecho.
Ainda não li nenhum thriller de Dicker, mas acredito que alguns dos seus leitores possam ficar desapontados com este título. Na verdade, não é difícil perceber, logo após as primeiras páginas, quem/o que está por trás da referida catástrofe. Contudo, parece-me que não é isso o que aqui importa. O que realmente me prendeu foi o tom divertido de todo o discurso, que a cuidada tradução de José Mário Silva conseguiu trazer para a nossa língua com ternura e muito humor.
“Nas minhas conversas com leitores, o que mais me emociona são as leituras partilhadas em família, entre amigos ou em clubes de leitura. Por isso, tentei escrever um livro que pudesse ser lido e partilhado por todos os leitores, dos 7 aos 120 anos. Com os vossos filhos, os vossos pais, vizinhos, amigos ou colegas de trabalho. Um livro que vos dê vontade de ler e de dar a ler. E que nos permita reencontrar-nos.” (Joël Dicker, da contracapa). Este livro é, sem dúvida, um lugar de encontro e reencontro. A focalização do mundo pelos olhos de Joséphine, a narradora, e dos seus amigos da escola “especial”, transforma a narrativa num lugar comovente, que transfigura o real num espaço de tolerância, respeito e imaginação.
Joël Dicker nasceu na Suíça. Estreou-se na literatura aos dezanove anos, com a obra O tigre. O seu segundo romance, A verdade sobre o caso Harry Quebert, transformou-o num fenómeno literário: foi publicado em trinta e três países, vendeu mais de quatro milhões de exemplares e venceu o Grande Prémio de Romance da Academia Francesa, o Prémio Goncourt des Lycéens e o Prémio Lire para melhor romance em língua francesa. Seguiram-se os títulos O livro dos Baltimore, O desaparecimento de Stephanie Mailer, O enigma do quarto 622, O caso Alaska Sanders e Um animal selvagem, todos publicados em Portugal pela Alfaguara.
É possível “escrever um livro que [possa] ser lido e partilhado por todos os leitores, dos 7 aos 120 anos?” Não é fácil… Uma Catastrófica Visita ao Zoo não é, certamente, um título consensual. Contudo, eu ri-me em vários momentos da obra e trouxe-a para férias para a reler com a minha filha. Da minha parte, considero a missão enunciada cumprida: “Um livro que vos dê vontade de ler e de dar a ler”.
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