A Assírio & Alvim reúne neste Poesia toda a obra poética de Eugénio de Andrade, a partir da última edição revista em vida pelo autor e com prefácio de José Tolentino Mendonça.
Eugénio de Andrade foi um poeta da sua cidade, um Porto de outros tempos, mais pacato e de gentes simples. Nascido em 1923 no Fundão, baptizado como José Fontinhas, foi na Invicta que criou raízes e deu asas à sua palavra, apoiando-se numa imagética fortemente simbólica e emocional, empática por natureza, pelo uso de símbolos universais e evocativos, como a rosa, o Amor, a infância, os sorrisos, as mãos, o fogo, o sal, os sentidos em toda a sua amplitude. A aposta numa linguagem limpa e clara foi sempre um tr(i)unfo da sua arte, fugindo a referências obscuras e ao pedantismo dos vocábulos indiscerníveis para demonstrar sabedoria. Fazia poesia por devoção, para si e para quem o lia, e cada palavra soava a um tesouro resgatado ao Tempo, como se do resultado de um trabalho arqueológico se tratasse.
O amor
é uma ave a tremer
nas mãos de uma criança.
Serve-se de palavras
por ignorar
que as manhãs mais limpas
não têm voz.– Quase nada
O contacto com a sua poesia desconcerta pela simplicidade das estrofes, pela estrutura despida de artificios, mas sem que tal ressoe no alcance de cada vocábulo e na forma como cada poema se basta e envolve o leitor num longo abraço.
Melhor que qualquer tentativa de discrição é a leitura desta Poesia, em doses generosas e quotidianas, para nos devolver alguma fé no Mundo e pela saudável e indispensável dose de Beleza Diária Recomendada que garante.
Excelente opção para este Natal, este rival analógico à omnipresente tecnologia, sem necessidade de carregar baterias para o seu uso desenfreado, com possibilidade de múltiplas páginas abertas em simultâneo. Uma edição indispensável.
Mais recensões/crítica literária AQUI.