20 de Julho de 2019. O pôr-do-sol envolvia a cidade de Cascais. Pequenos barcos pululavam na marina, numa perfeita comunhão entre mar e terra. À nossa espera, um completo devaneio nos sulcos de uma pauta musical prestes a absorver uma infinidade de ritmos e sons, sem olhar a géneros, sem receio de definições. Assim recebemos Jamie Cullum, de braços abertos, para mais uma noite inesquecível do EDP Cool Jazz.
Sobre Jamie Cullum já quase tudo foi escrito. Com 39 anos de idade, o britânico continua a flutuar nas águas do jazz de uma forma totalmente original, cativando um público heterogéneo com temas matizados pela energia vibrante da pop e do rock. Apelidado de “Sinatra in jeans”, Jamie Cullum aprendeu a tocar piano “de ouvido” e rendeu-se ao maravilhoso mundo da música inspirado por Oscar Peterson e Dave Brubeck. A sua paixão pela música, e em especial pelo jazz, é semanalmente partilhada num programa da BBC Radio 2, desde 2010. Nos seus álbuns, podemos encontrar referências a George Gershwin, John Coltrane, Radiohead, Jimi Hendrix ou Jeff Buckley.
A Cascais, Jamie Cullum trouxe o novo álbum de estúdio: Taller (2019). Como o próprio músico contou aos milhares de fãs que encheram o Hipódromo Manuel Possolo, o nome do álbum não é propriamente uma referência à sua estatura, mas sim uma afirmação sobre a importância de ver mais além, o que de imediato nos lembrou a simplicidade de Alberto Caeiro, que da sua aldeia via quanto da terra se pode ver do Universo. Somos do tamanho do que vemos…
Recebido em êxtase, Jamie Cullum explicou em segundos ao que vinha. Acompanhado por uma secção rítmica imaculada e uma expressiva secção de metais e aconchegado pelas poderosas e quentes vozes de Aisha Stuart e Shanna Goodhead, apaniguadas do público ao longo de todo o concerto, o britânico não tardou a subir para o piano e a abraçar-nos com o eterno jeito de enfant terrible.
Os temas do novo álbum foram alternados com êxitos antigos, covers e momentos de pura improvisação, numa longa viagem pelo jazz, pop, rock e soul. “For the love”, “When I Get Famous”, “Taller”, “Don’t Stop The Music”(Rihanna), “Ex-Factor” (Lauryn Hill), “Nice for What” (Drake) e “What a Difference a Day Made” foram alguns dos temas escolhidos. Um dos momentos mágicos da noite ocorreu quando Jamie Cullum e os músicos que o ladeavam entoaram “Mankind”, com uma espiritualidade gospel, apenas amparada pelo contrabaixo. E logo de seguida, inebriado pela energia de Cascais, Jamie Cullum não resistiu e, ao som de “Just a Gigolo”, desceu do palco e dançou. De pé, nas bancadas, na relva ou mesmo em cima das cadeiras, cada um dos melómanos que assistiam ao concerto foi o par perfeito do britânico, que acedeu carinhosamente a todos os convites lançados. E assim poderia ter terminado a jornada, mas Jamie Cullum não quis, tendo perpetuado o êxtase com “Sinnerman” de Nina Simone. Antes do final, e após ter manifestado o seu desgosto quanto ao previsível Brexit, Jamie Cullum ainda apresentou “The Age of Anxiety”, balada reflexiva sobre os dias que vivemos, desenvolvida num expressivo crescendo até eclodir com a ajuda do público, em uníssono. “Mixtape” foi o tema escolhido para a indiscritível apoteose final, levando a multidão a saltar incessantemente por entre o pulsar dos derradeiros acordes do piano.
A cidade que outrora acolheu Miles Davis, Ornette Coleman e Charlie Haden, no Pavilhão do Dramático, tenta todos os anos honrar esses pergaminhos com músicos capazes de inspirar uma plateia que anseia ser contagiada. Em 2019, com Jacob Collier, Snarky Puppy e Jamie Cullum, entre outros, a missão foi cumprida.
Obrigado Jamie, por mais uma noite que fez a diferença!
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