Diz-se no meio editorial que o título é a primeira coisa a escolher e a última a decidir. O que dizer de Teoria das Catástrofes Elementares? Que é forte, marcante, que atrai de imediato para um abismo de crise e desordem.
Segundo René Thom e a teoria matemática, as catástrofes, transformações grandes e repentinas do comportamento de um sistema, são o resultado de pequenas e imprevisíveis alterações passadas. Assim é esta obra. Assim será a vida.
De colapso em colapso, Vera, a protagonista, leva-nos de volta para os anos 90, pelos caminhos de uma família da alta burguesia de Cascais, sem dinheiro. O olhar de criança e de adolescente torna a narração mais leve, bem-humorada, e arrasta-me também para esse tempo de cassetes de vídeo, telenovelas e cores Benetton.
É um romance de procura, de crescimento. Um Bildungsroman. Nesta cartografia do caos, Vera é a aproximação possível à verdade. Ao longo da obra, tenta encontrar-se a si e à família, conhecer os seus lugares e os antepassados. “A infância é passada a preencher com imaginação os buracos do que não se compreende.” (p. 140) E a escrita quebra-se em fragmentos, que somos chamados a unir, a completar. São coincidências, ciclos que se repetem:
“Causas, coisas, consequências, tudo tecido e entretecido até resultar neste acaso improvável a que chamamos real.” (p. 97)
Se o primeiro capítulo nos abalroa com o desaste da mãe, o ritmo rápido do texto empurra-nos para a frente, e quase esquecemos a dureza dos temas aqui tratados: alcoolismo, saúde mental, racismo, violência. Estes tópicos estão latentes ao longo de toda a obra e cristalizam-se em momentos de crise interior, familiar, social, de onde emerge, sobretudo, a vivência da mulher, que sofre, que é vítima, que cala e esconde, que às vezes se liberta e grita.
“Família, essa palavra sem limites.” (p. 89) É nela que tudo acontece. É lugar de crescimento, mas, sobretudo, de desilusão. A verborreia do pai da protagonista representa esse fosso entre o discurso e o real, entre a foto e o espelho. “Como continuar a gostar de alguém que fez coisas horríveis?” (p. 148) A redenção possível parece ser o reconhecimento da catástrofe. Como diz a protagonista,
“Seja como for, é sempre melhor vivermos como se tudo o que nos aconteceu nos tivesse acontecido.” (p. 65)
Em vários momentos, o livro levou-me para os meus próprios colapsos e a minha própria família. No entanto, o tom falsamente leve, o carácter errático da narração e a escrita estilhaçada criaram uma distância entre mim, como leitora, e os abismos que se abriram no texto, impedindo-me de mergulhar com as personagens nas suas quedas e de fazer com elas também a minha revolução. “Muriel Rukeyser diz que o universo não é composto de átomos, e sim de histórias.” (p. 97) Em Teoria das Catástrofes Elementares, fiquei com a sensação de que algumas histórias ficaram por contar, alguma coisa ficou em mim por acontecer.
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